Da quadratura,

Esta coisa que está aí diante do espelho, que tu acreditas ser, nada mais é do que uma figura oca. Uma figuração. Isto que estás sendo e a ser, tem te contornado. Não escutas, mas uma vida inteira vive te conclamando, vida que te concita enquanto mergulhas entorpecida nas vidas alheias. Simulacros de vidas não vividas. Não vivas. Não vibrantes. Essas que visas enquanto arrastas o polegar para cima. Me permita – por um breve instante – ajustar as cordas dos teus afetos. Sinto que precisas disso. Meu espírito de poeta requisita a atenção dos teus afetos. As próximas linhas conversarão com tua alma. Mas antes, em função de habitarmos – eu e você – um horizonte de sentidos existenciais, se faz necessário realizar uma subversão da vida. 

A vida parece ser isto – um experimento físico. Um punhado de terra formoseado em contornos. Isto aí que vaga de lá para cá. Em meio a atmosfera. Primaveras e verões. Invernos e outonos. Vida parece ser isto que vaga sob a luz do sol e no sombrejo da noite. Esta coisa que dói machucando e se machuca por um prazer a mais. Que enruga sobre a terra que participa no corpo do mesmo modo que do corpo se esvai. Para uma vida assim, trágica, dolorida e pulsante há uma existência. Viver é um modo de existir. Pode-se viver de diversas maneiras. Existir só de um modo. Existência é isto que vibra tonalmente. Existir é poder ser que se é. É poder ser no modo do poder ser. Redundante? Sim! É redundar sempre e a cada vez. Uma vez mais poder ser e, sendo, poder permanecer. Vida é um modo da existência. O existir é tudo!  

Existir – é isto – que te falta. Existir que te falta. Isto é: – te falta existir! Sinto muito jogar com as palavras. Espero que me compreendas, mas preciso esgarçar as palavras e lançá-las aos sentidos. Toparias repetir, infinitas vezes, essa vida que vivestes até aqui? Um eterno retorno (Nietzsche) das mesmas escolhas. As mesmas sensações, vibrações, conexões e afins. É isto que queres uma vez mais por toda eternidade? Um eterno retorno do mesmo? O mesmo não é o igual. O mesmo é o mesmo, isto é, o único. Como te sentes com isso? Este pensamento te apavora? Sim? É hora de existires toda existência que pulsa obliterada em ti. Tomas a ti uma vez mais e não permitas desperdiçares teus dias do modo como tens feito. Há em ti uma existência não existida, ainda. 

Assumas e não fugas de teu entorpecimento. Olha para teus braços e vê a extensão deles. Olha para tuas mãos e vê o que há dentro delas. Teu polegar e teus dedos. Olha para o que é extensão de tuas mãos. Teus braços e os milhões de abraços que te esperam. Tuas mãos e os apertos conciliadores entre vidas e mundos, entre guerras e apaziguamentos. Tuas mãos que no saudar despedem-se com um até breve ver. Tuas mão e polegares que afirmam vidas, cuidados e bem querer. Tuas mãos que te abraça ao pensares e quando pensas uma delas suporta teu queixo enquanto o polegar afaga teu rosto em cada franzir da tua testa. Esta é uma existência de ti e teu ser e também de tuas mãos que ainda não te apropriastes. Sabes por quê? Porque tuas mãos e teu polegar permanecem entorpecidos arrastando para cima os simulacros de outras existências não existidas.  

Assumas teu entorpecimento, afinal ele poder ser-te o salto sereno, em paz e leve. Não de hoje, mas de há muito já perdemos aquela sublime capacidade de nos atermos ao que nos atém como vigor de encantamentos. De carência em carência os encantos do existir subjazem na inanição quase sempre esquecidos. Mas, é precisamente por sua causa, esta que é propriamente causa de ti e num só tempo que és causa de nada, que podes experimentar, uma vez mais, o encanto. Que podes, uma vez mais experimentar existir toda a existência que te escapa pelo polegar. Há diante disto que te escapa todo aquele espanto mágico e criador que perfaz as primeiras experiências do pensar. Pensar que enquanto dom, doação para auscultar. Em cada ausculta, uma celebração endereçada a ti. Celebrativo como deve ser cada por e propor das tuas escolhas, estas que repetirás por toda a eternidade. Te avias, então, da quadratura, devagar e com profundidade afetiva; não esqueças dos pensamentos íntimos que só a ti concitam. Visa-os com olhos e teus polegares delicados.  

Mas, não te apresses.  

Recife, primavera aos 28/11/24

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Sobre o Autor

Kadu
Kadu

Escritor, ensaísta, professor de fenomenologia hermenêutica heideggeriana. Pesquisador independente. Linguagem e técnica são suas vertentes de pesquisa. Formado em rádio e tv com mais de duas décadas dedicadas a comunicação. É criador da comunidade heideggerfacil, practitioner em PNL, locutor publicitário, radialista, ator e músico. É palestrante e consultor em comunicação com mais de 32 anos de experiência. E-mail: contato@kadusantos.com.br

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